(...)


Não conto mais as notas,

Não conto mais as sílabas.

De que me adiante a matemática

Se o que eu quero mesmo é prática

É misturar o som, a voz e a vida?

Canção

Entre as notas e as partituras;
Entre os cadernos e as escrituras;
Entre os meus lábios e as coisas tuas
Vai correndo lenta a minha vida impura.

Ah, o prazer de te ver e viver apenas,
De desperdiçar as horas e o dia
Em qualquer coisa ou fantasia,
Em qualquer Dó que valha a pena.

Pois não há metáfora ou veia nua,
Não há culpado ou mea culpa
Neste caso, nesta viva, nesta música
Que é mais minha do que tua.

A rosa do jardim


Há sobre a mesa um velho par de óculos
Daqueles que se esquecem dos ouvidos.
E tal melancolia vem e me alcança
Que já não sei se choro, não sei se rio.

É que nos olhos daquele que é cativo
Uma medonha semelhança se incendeia
E faz correr o sangue forte pela veia
E faz voltar aquela voz da qual eu vivo,

Que diz que a moça é torta e criminosa,
Que não caminha como as outras,
Que é chorosa e meio louca
E que é da vida a sina de ser rosa.

A música parou?




Violino parado,

Pensar agitado,

Cadeira vazia,

Cantar esgotado,


Não há um só dia

Que essa luz de guia

Me faça ir dormir

Sem querer poesia.


Pois ando parado

Todo ensimesmado,

Co’as mãos muito frias

Pensando calado.


Sou deus estragado,

Não crio, não mato.

Só penso vazio:

Canto, danço... Caio.

Ver o Tempo

Caminho entre a gente
Porque me pareço com a gente.
E meus passos são de guerra,
Minhas vozes são de cólera
Meus algozes, frios e fortes.
Minhas lutas são de morte.

Não temo frio, não temo vento.
Temo a algema e o passar do tempo
Que por vontade ignorante
Fez cair no esquecimento
O que é de nós vontade pura
E o que nos deve o pensamento.

Fluir, correr, voar.

Se te mata a vida

Com o peso de ser,

Perdido no tempo

Sem tempo de estar,


Enterra o teu lado

Que tudo quer ter.

E foge do mundo

Que mata o pensar.


Vai sentir o vento

Que passa a dizer

Que a vida é bem mais

Do que se acumular,


Que há muito mais

Que se possa viver

E com a verdade

Tu vais te encontrar.


Levanta contigo

A poeira no ar,

Te deixa fluir

Como a água do mar,


Dá voltas no mundo

Pra não mais voltar

E só leva contigo

O que gostas de ter.


Vai, deixa o destino

O teu passo guiar.

Dá as costas ao vento

Que vai te empurrar


No passo descalço

Para não te encontrar

A vida pequena

Que mata o teu ser.

Tão menino

Cada verso pequenino
vai nascendo
e vai morrendo.
De tão curto
e tão menino,
Nasce fraco e logo cai
no esquecimento.

A chuva da calçada

E desce
Em tamanho e proporção
Uma chuva densa e grave
Que de pingo em gota
Vai formando poça
E estalando forte sobre o chão.

Se cada gota me levasse
Da memória uma lembrança
Já teria enchido um poço
Com história e amores,
Com recordações e contos,
Com meus pobres velhos rostos.

Mas é prata que cintila
A água fina que
desagua.
Não é triste nem é nada
É apenas pura água
O que escorre e o que se cura
E que desmancha na calçada.

Quem sou eu

Minha foto
Sou o verbo: o estado, o tempo e a ação contínua.

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